Maestro Batista - Músico Mossoroense
Extraído do caderno "Universo" do Jornal "O
Mossoroense"
MAESTRO BATISTA
ENTREVISTA
A paixão pela música começou na infância. Pai de quatro filhos, sendo dois deles
músicos, Maestro Batista é considerado um dos maiores representantes do cenário
musical mossoroense. No último dia 2, aos 73 anos, depois de 18 dias internado,
o músico faleceu vítima de insuficiência renal, e como forma de
homenageá-lo o jornal O Mossoroense republica esta entrevista, que foi
concedida poucos dias antes de sua internação.
POR PATRÍCIA PAZ AMANDA MELO.
O Mossoroense - Quando o senhor começou a se interessar por música? Conte da
sua trajetória musical?
Maestro Batista - Comecei a tocar ainda na infância. Na adolescência entrei
para a Banda de Artur Paraguay, fiz parte dela por pouco tempo, depois integrei
o "Totõezinho e Seu Conjunto" que se firmou e ficou conhecido em todo
o Estado. Depois de alguns anos de trabalho decidi deixar o grupo. Fiz parte de
vários outros conjuntos como "Infla Seis", passei rapidamente pelos
"Perdidos e Achados", também fiz parte dos "Magnatas" e o
"The Pop Som". Depois fui convidado pela Universidade para
organizar o conservatório de música. Na época o reitor era Antônio Capistrano.
Eu colaborei com a fundação do conservatório, continuei ensinando e ainda estou
por lá, toco hoje no Grupo de Chorinho Ingênuo.
OM - Você aprendeu música como autodidata ou alguém lhe ensinou a tocar?
MB - A sensibilidade da música impele a gente a buscar a aprendizagem. Quando
eu entrei para a Banda de Música Artur Paraguai recebi muitas instruções dele e
fui pegando o jeito. Mas essas instruções foram por pouco tempo, por conta do
seu estado de saúde e sua idade. Então eu comecei a comprar livros de teoria
musical, a ouvir grandes músicos, boas orquestras, a associar aquilo que ele
tinha me ensinado ao que encontrava na teoria dos livros e no que eu ouvia e
dos grandes músicos que tocavam aqui. Hoje, modéstia à parte, eu tenho
facilidade de ouvir uma gravação e passar tudo para a pauta, seja qual for a
orquestra.
OM - Quais são os instrumentos que o senhor toca?
MB - O que eu me sinto mais à vontade é o saxofone, por ter sido o meu
primeiro instrumento, mas na época dos grandes carnavais toquei Pistom, que tem
o manejo totalmente diferente. Hoje eu toco apenas o saxofone e o clarinete.
OM - Dois dos seus filhos também são músicos, o senhor os influenciou de
alguma forma?
MB - Eu dizia para eles: turma, a profissão que lhe dá base para o futuro não
pode ser música, porque a região em que vivemos não oferece muitas
oportunidades para os músicos. Mas a música para eles falou mais alto e mesmo
buscando outras profissões eles insistiram nisto. Um deles, Antonio Carlos
Batista de Sousa, já me ultrapassou em termos oficiais, já que é bacharel em
música pela Universidade do Estado do Ceará e também tem especialização na
mesma universidade. Ele fez concurso para professor da Uern no curso então
recém-criado de música e passou. O outro, Marcos Batista de Sousa, toca vários
instrumentos e hoje é contramestre da Banda de Música Municipal. A música teve
uma atração superior e fez com que eles realmente seguissem esse caminho, mas
eu, na verdade, não incentivei muito.
OM - Numa época em que as pessoas apreciam músicas com pouca qualidade apenas
por ceder aos apelos da mídia e da indústria fonográfica, ainda se pode falar
em evolução musical?
MB - Estamos numa época em que a evolução da música foi para pior, hoje o que
predomina e o público aceita é a música que não tem essência. Hoje tudo vem
empacotado, o povo quer vibração, zoada, pancadaria rítmica para que não a
alma, mas o corpo vibre e se delicie daqueles momentos.
OM
- Que músicos influenciaram na sua carreira?
MB - A minha maior influência musical é a Orquestra Tabajara, de Severino
Araújo, que ainda hoje faz gravações e shows no Sul do país e foi considerada
de nível internacional. Esta orquestra pra mim é o maior exemplo, o maestro
Severino não me conhece, mas eu me considero seu aluno. Também
apreciava muito Tommy Dorsey, Glenn Miller, Artie Shaw, grandes orquestristas
americanos nos quais eu buscava inspiração e aprendizagem.
OM - Como o senhor tinha acesso a esses artistas?
MB - Através do disco. Eu apreciava todo o acervo das minhas orquestras
preferidas, ouvia, captava cada detalhe e somava aos meus conhecimentos.
OM
- O homenageado deste ano no Festuern é o senhor, o que isso significa?
MB - Pra mim foi uma surpresa muito especial, me incentivou e me deixou
bastante sensibilizado. O que eu tenho feito pela música é acima de tudo uma
satisfação. Não me nego e nem me negarei a colaborar seja com qualquer outro
músico, ou com a arte musical da minha cidade.
Essa homenagem me deixou muito feliz, porque olhando para
mim, olhando para o que eu fiz, eu acho que fiz tão pouco, mas dentro das minhas
limitações eu dei o meu melhor com muita boa vontade, com vontade que a música
cresça não só em Mossoró, mas em toda nossa região.
OM - Durante o tempo que você trabalhou no conservatório de música,
que tipo de experiência você adquiriu formando novos músicos?
MB - É uma experiência muito boa porque aquilo que você vai passando
para o aluno você também colhe dele, muitas vezes um detalhe que lhe desperta
para desenvolver uma nova técnica para melhorar o que é ensinado. É obrigação
do professor fazer de tudo para que o aluno entenda o método pelo qual ele
procurou transmitir cada detalhe do conteúdo. Eu aprendi muito com os meus
alunos, porque é ensinando que também se aprende.
OM - Você acha que a música é um dom, um talento nato ou algo que qualquer um
pode aprender desde que se empenhe?
MB - Todos nós em maior ou menor escala trazemos um pouco do dom musical, é um
dom natural que Deus nos dá, porém em parte a hereditariedade também ajuda.
Existem pessoas que nascem com esse dom sobrando, e chegam a abusar. Alguns
músicos são tão bons que desperdiçam este dom, não assumem responsabilidade
profissional, não buscam um aperfeiçoamento, uma aprendizagem mais apurada,
assim como existem outros que se esforçam bastante e não conseguem passar do
nível básico. Uns com excesso de boa vontade e outros com excesso de talento
desperdiçado. Porém, com empenho qualquer pessoa aprende alguma coisa sobre
música.
OM - Como o senhor avalia o cenário musical de Mossoró?
MB - Com o surgimento do conservatório de música o cenário musical da cidade
melhorou muito. Hoje temos grupos muito bons. Nós temos músicos muito
promissores aqui. Se provisoriamente eu estou segurando a batuta já vejo quem a
segure e continue o meu trabalho. Então eu acho realmente muito promissor o
cenário musical mossoroense e fico muito feliz com isso. Hoje já se vê uma
camerata de violinos com oito músicos, coisa que antes não se via. Acredito que
em pouco tempo nós teremos uma orquestra sinfônica em Mossoró, este é um dos
meus maiores sonhos, muito embora eu não seja atuante nesse movimento, mas a
minha vontade chega aos demais colegas e colabora para que esse projeto se
concretize.
OM - Nós sabemos que é difícil viver de música no Brasil, mas, mesmo assim,
você acredita que é compensador, você aconselha os jovens a seguirem carreira
de músico apesar das dificuldades?
MB - Para que os jovens tenham isso como profissão, tirem dali o seu
sustento, eu não aconselho música. A musicalidade vem e a gente não pode fugir,
mas como um 'hobby'. Quando isto possibilita algum retorno financeiro é
excelente, porque une-se o útil ao agradável, mas isto nem sempre acontece.
Enquanto atividade profissional eu não acho que se deva pensar só nisso, a não
ser que a pessoa tenha um excelente desempenho musical, estude bastante e
busque os grandes centros. Só assim é possível ser bem sucedido nesta
carreira. Por que a nossa região não oferece o reconhecimento necessário
para dar qualidade de vida aos musicistas, claro que isto está mudando, mas
ainda existe um grande caminho a se percorrer para se chegar ao nível ideal.
OM - Se houvesse esse reconhecimento o senhor gostaria de ter vivido só de
música?
MB - Sem dúvida! É bem verdade que eu teria que me esforçar muito para fazer
jus a esse retorno da sociedade, mas se houvesse essa condição, com certeza eu
viveria só de música. Entretanto, eu não tenho do que reclamar, porque atuando
em outras áreas eu também aprendi muitas coisas, mas a música sempre foi uma
prioridade.
OM - O que a música significa para você?
MB - A música faz parte da minha vida. Quando eu ouço esqueço todos os
problemas, as dificuldades se afastam e muitas vezes vêm aquilo que nós
chamamos de viagem do espírito. A gente sente muitas vezes a alma flutuar,
embalada na beleza da harmonia musical. A música é um dos alimentos da alma.
Então, enquanto eu tiver um suspiro eu continuarei a soprar, nem que seja para
tirar a poeira do meu saxofone.
FONTE – BLOG DO MENDES & MENDES
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